Pecebes Rabelo é sanfoneiro e cantor de forró, natural de Seabra, na Chapada Diamantina (BA). Com raízes profundas no forró pé de serra, ele mantém viva a tradição nordestina por meio de um repertório que combina clássicos do gênero com composições autorais. Sua música marca presença nas festas de São João, eventos culturais e celebrações populares na Chapada Diamantina.
O artista teve o primeiro contato com a sanfona aos nove anos, durante uma viagem a São Paulo, quando um tio lhe apresentou o instrumento, ainda em versão de brinquedo. A partir dali, a paixão pela sanfona ofuscou o antigo desejo de aprender teclado. Criado em um lar onde o forró e a música popular brasileira sempre estiveram presentes, Pecebes só começou a estudar o instrumento de forma aprofundada aos 15 anos, dando início à sua trajetória de sanfoneiro.
Entrevista
Victor Ribeiro: Você contou que teve influência da família nesse início, mas teve alguma figura em especial que te inspirou a seguir o caminho da música, como artista e forrozeiro, sanfoneiro ?
Pecebes Rabelo: Eu sempre gostei muito de Flávio José, Dominguinhos, Luiz Gonzaga. E sempre fui muito fã de Hugo Luna, daqui da cidade de Seabra. Que é meu padrinho, meu amigo, meu “irmão velho” e é um cara que até hoje a gente se entende muito bem, sabe? Onde a gente se encontra, sai forró, sai música boa. Então ele é uma das figuras que eu posso dizer mais importantes pra me incentivar, até hoje, sem sombra de dúvidas.
Victor Ribeiro: Como é pra você ser sanfoneiro hoje na Chapada Diamantina? Como você enxerga essa vivência como artista na região?
Pecebes Rabelo: Rapaz, ser sanfoneiro em si já é muito bom. Ter as condições, o dom de tocar esse instrumento maravilhoso, já é uma dádiva. E ser sanfoneiro aqui na Chapada, eu acho que em qualquer lugar, é uma batalha, né? Porque hoje, inclusive na nossa cidade, aqui na nossa região, não é tão fácil tocar o forró pé de serra ou o forró em si. A gente se dedica a levar a cultura pra frente, mas nem sempre tem espaço pra tocar. Inclusive nos grandes palcos, nos grandes São Joões, às vezes acontece de a gente não ter esse espaço. Então, eu creio que tem como melhorar isso, tem como dar mais espaço, tem como dar mais oportunidade, não só pra mim, mas pros meus amigos sanfoneiros também, que fazem o forró. E eu acho que isso facilitaria pra gente continuar levando essa cultura pra frente. Hoje não está sendo fácil ser sanfoneiro e levantar essa bandeira. Realmente é uma guerra. Tem que ter muita força de vontade. Eu toco há 15 anos e venho enfrentando um monte de altos e baixos pra fazer a sanfona chegar aos palcos.
Victor Ribeiro: O que muda na rotina e nas oportunidades antes do São João, durante e depois dessa época?
Pecebes Rabelo: É que no São João a gente tem a possibilidade de tocar mais. Várias pessoas querem mais sanfoneiros nas festas, independentemente de a festa ser grande ou pequena. Então, a gente consegue ter mais shows. Embora eu não esteja tendo facilidade para fechar muitos shows, né? Está tendo essa dificuldade. Já toquei muito mais, já cheguei a ficar tipo 20 dias tocando direto. Hoje já não tem isso. E depois do São João, no pós-São João, o que pega é que a gente não consegue fechar mais shows como no São João. Claro que o São João é uma temporada de alta, né? Alta estação e tal. Mas tem muitos eventos, como cavalgadas, Festa do Vaqueiro, que comportam forró. Muitas festas comportam o forró, inclusive o forró pé de serra, um forró mais atualizado, um forró de vaquejada, que é o meu caso. Tenho um repertório amplo que abrange todos esses tipos de forró que eu te falei.

Do mais atualizado ao forró pé de serra. E quando passa o São João, meio que fica esquecido. E quando você corre atrás da oportunidade de fazer um show, você não consegue. Entendeu? E eu falo isso da nossa região e da nossa cidade também. Às vezes, a gente não tem a oportunidade de estar tocando sempre. Então, eu acho que, se isso melhorasse, fortaleceria muito mais a cultura do forró aqui.
Victor Ribeiro: Você acredita que existam outros obstáculos, além do fato de não ser o período de São João e da possível queda na popularidade do forró, que dificultem a realização de shows?
Pecebes Rabelo: É só querer colocar. Eu falo isso porque já toquei em vários eventos diferentes, e fora do São João. Já toquei muito, então eu acho que o empecilho é só das pessoas que não querem colocar. Os caras falam assim: “Vou colocar o Pecebes, vou colocar o Hugo Luna, Denny Reis, que faz forró.” Chega e coloca, tem espaço. Só não colocam porque não querem, entendeu? O empecilho é simples.
Victor Ribeiro: E o que você acredita que mudou desde aquele mês em que teve uma grande quantidade de shows para esses meses atuais, em que diminuiu? Acha que foi por conta de investimento em outras bandas ou em outros gêneros musicais?
Pecebes Rabelo: O governo da Bahia está patrocinando muitas bandas. É o que acontece. A Sufotur patrocina muitas bandas. E essas bandas acabam tomando espaço na grade, até mesmo de quem é filho da terra, da região.
Muitas bandas grandes chegam na grade do São João; inclusive, tem hora que nem estão na grade oficial e, quando você vai ver, a banda vai tocar. Nem sabe que vai tocar e, na hora do São João, é onde tiram o espaço dos artistas da terra. Entendeu? São muitas bandas patrocinadas pelo governo. Isso dificulta para quem é da região, para os filhos da terra, os artistas locais. E eu acho isso errado, tirar o espaço de um cara que é da cidade para colocar uma pessoa de fora.
Uma coisa é criar uma grade que comporte todo mundo sem prejudicar ninguém. Aí eu sou a favor. Independentemente do que colocarem lá, eu acho que o São João é forró. Independentemente se é o forró mais atualizado, forró pé de serra e tal, eu acho que isso é o que mais nos atrapalha. E não é só aqui na nossa cidade, mas no geral. Quem é de Iraquara, que é a cidade vizinha, não toca em Seabra. Quem é de Seabra não toca em Iraquara porque não tem vaga nem para eles, entendeu? De tanta banda que chega.
Victor Ribeiro: Como é a recepção do público nos seus shows durante e após o período de São João? Você possui um público específico ou é mais diversificado?
Pecebes Rabelo: Rapaz, sobre a recepção do público, em todo lugar que eu toco, eu não tenho do que reclamar. Inclusive aqui em Seabra. O público chega, participa do meu show. É um público que vai do jovem à pessoa mais velha, né? Chega junto, participa, gosta do meu show, e eu acho que, pra mim, isso vale mais do que um cachê, né? Fazer arte vale mais do que dinheiro, fazer um show e as pessoas gostarem. Então, assim, eu não tenho do que reclamar do meu público, só tenho a agradecer em toda cidade que eu passei. Eu já toquei aqui em Seabra, por exemplo, que é uma cidade onde a cultura é de o pessoal sair tarde, né? Na festa. Eu toquei às oito horas e tinha 30 pessoas.
Se eu te falar que foi um dos melhores shows que já fiz aqui em Seabra, você não acredita, porque não era a quantidade de pessoas, era a energia. Entendeu? Essas 30 pessoas que estavam lá realmente queriam muito ver o show e participaram bastante, a energia estava em 100%. Então, assim, eu entreguei o melhor show que pude, dei o melhor, e pra mim foi um dos melhores shows que já fiz, velho.
Não me arrependi em nenhum momento de ter subido no palco e feito o trabalho, entendeu? Mas tem isso de tocar primeiro, pegar o horário com menos gente na praça, e tal, acontece demais, assim, com todo mundo, na verdade.

Victor Ribeiro: O que você gostaria que fosse diferente na forma como o forró, os forrozeiros e os sanfoneiros são valorizados na cena musical da sua região ou, de maneira mais ampla, na Bahia ?
Pecebes Rabelo: Rapaz, o que eu queria que mudasse era que a gente tivesse mais oportunidade para tocar, mais respeito para fazer um trabalho digno mesmo, sabe? Mais condições. Até na questão de valorização também, de dar condições para a pessoa se valorizar.
Porque, se você ganha melhor, faz um trabalho melhor, se empenha mais. Como eu costumo falar, o que faz o show acontecer é o “money”. Se você tem um cachê legal, consegue investir no seu show para que ele fique bom.
Os artistas de nível nacional cobram caro porque o show, para acontecer naquela pegada, naquela beleza toda que a gente vê, custa dinheiro. Só que, se um artista local não tem condições nem oportunidade, como vai apresentar um show legal? E os artistas grandes foram locais, entendeu? Se a gente não tiver essa oportunidade, não consegue aperfeiçoar, só dá pra meter a cara e tocar mesmo assim, com muita dedicação. Só que, às vezes, não dá para investir tanto.
O material de banda para fazer um show legal custa muito caro, é muita grana para bancar. Então eu acho que a gente precisa melhorar nisso: ter mais espaço para investir e também para ganhar.
Victor Ribeiro: Você pode falar um pouco sobre seus projetos? Tem algo novo em andamento ou alguma ideia que você pretende tirar do papel?
Pecebes Rabelo: O “Vai Ter Forró”é um evento que eu realizo em Seabra, voltado para o forró pé de serra, eu e meu amigo Iago Aquino somos os idealizadores da festa. É um movimento que a gente faz com a proposta de colocar sanfoneiros tocando e cantando. A ideia é fortalecer não só o forró, mas também valorizar o sanfoneiro. A festa sempre acontece em maio.
O objetivo do Vai Ter Forró é espalhar o forró na nossa cidade, mostrar para os jovens, que muitas vezes nem conhecem esse estilo, a oportunidade de conhecer, de dançar e até de ter vontade de tocar um instrumento do forró, como a sanfona, a zabumba, o triângulo, algo assim. Essa é a proposta do Vai Ter Forró.
Sobre projetos futuros, a ideia é lançar músicas novas para o público, produzir material audiovisual, algo que impulsione minha carreira e mostre as novidades que estão chegando. O intuito é crescer com a sanfona, sempre reforçando que a sanfona está sendo valorizada, que o forró está sendo valorizado.
E, como eu falei, hoje eu não toco apenas o forró pé de serra. Atualmente, faço forró pé de serra, forró de vaquejada e também o forró mais atual, que aqui na nossa cidade a gente chama de vaneira. Então, tem muita novidade vindo por aí.
Victor Ribeiro: A trajetória de Pecebes Rabelo mostra a força de quem acredita na própria arte e na importância de manter viva a tradição do forró na Chapada Diamantina. Entre desafios e conquistas, ele segue impulsionando sua carreira com novos projetos, como o evento Vai Ter Forró. Da sanfona ao microfone, Pecebes representa uma geração de artistas que lutam por espaço, reconhecimento e respeito à cultura local. Para acompanhar seu trabalho sigam seu perfil no insta @pecebesrabelo.
Capa: Reprodução/Instagram/pecebesrabelo






